O tratamento padrão para câncer de reto atualmente envolve a chamada
terapia neoadjuvante – que consiste em aplicar quimioterapia e radioterapia para
reduzir o tamanho do tumor –, seguida por uma cirurgia invasiva que, na maioria
dos casos, tem grande impacto na qualidade de vida do doente. Uma parcela
significativa dos pacientes reponde tão bem à terapia neoadjuvante que poderia
até mesmo ser dispensada da cirurgia.
Teste molecular.
Cientistas do Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer, do Centro de Oncologia
Molecular do Hospital Sírio-Libanês e do Instituto Angelita & Joaquim Gama
trabalham no desenvolvimento de um teste molecular com o objetivo de auxiliar
os médicos a identificar esses casos. Os
resultados preliminares da pesquisa, que conta com apoio da FAPESP, foram
apresentados por Anamaria Aranha Camargo, diretora do Instituto Ludwig,
durante o evento “Fronteras de la Ciencia – Brasil y España en los 50 años de
la FAPESP. O simpósio fez parte das comemorações dos 50 anos da FAPESP e
reúniu, nas cidades de Salamanca e
Madri(2012), pesquisadores do Estado de São Paulo e de diferentes instituições
de ensino e pesquisa do país ibérico, em uma programação intensa, diversificada
e aberta ao público. Segundo Camargo, aproximadamente 3% dos pacientes não
respondem à terapia neoadjuvante e são submetidos desnecessariamente aos
efeitos adversos da quimioterapia e da radioterapia. No outro extremo, porém,
há 30% que respondem tão bem que nem sequer precisariam ser operados. “Esse
número pode chegar a 60% dependendo do protocolo usado. Precisamos de
ferramentas mais eficientes para diferenciar esses casos e fazer um tratamento
mais personalizado”, disse Camargo à Agência FAPESP. Hoje, a avaliação dos
resultados da terapia neoadjuvante é feita por meio de análises sorológicas,
toque retal e exames de imagem, como ultrassom e tomografia. Mas nenhuma dessas
técnicas é suficiente para dar ao médico a certeza de que o tumor desapareceu.
Na dúvida, os cirurgiões preferem operar. Dependendo da área afetada, a
cirurgia pode prejudicar a função sexual e causar incontinência urinária e
fecal. A boa notícia, porém, é que os avanços na área de genômica estão
permitindo a identificação de marcadores e o desenvolvimento de testes
personalizados que poderão livrar boa parte dos pacientes desse sofrimento. Em parceria com os pesquisadores Angelita
Habr-Gama e Rodrigo Oliva Perez, do Instituto Angelita & Joaquim Gama, o
grupo de Camargo sequenciou o genoma do tumor de sete pacientes e identificou
todos os rearranjos cromossômicos presentes em cada caso. Em seguida, foram
desenvolvidos ensaios moleculares que permitem rastrear a presença dessas
alterações cromossômicas em amostras de sangue. “Se o exame molecular detectar
a presença do DNA alterado, é sinal de que ainda há células tumorais produzindo
e liberando esse material na corrente sanguínea. Já se o resultado for
negativo, o paciente poderá repetir o teste de tempos em tempos para ter
certeza de que não houve uma recidiva”, explicou Camargo.
Validação da pesquisa em comento em grupo diferente.
O método já foi testado em dois dos sete pacientes que tiveram o genoma
sequenciado. “Como controle positivo, escolhemos um caso em que o exame clínico
havia confirmado que o tumor continuava presente e o teste molecular, de fato,
conseguiu rastrear o DNA tumoral no sangue”, contou Camargo. Como controle negativo, os pesquisadores
aplicaram o teste molecular em um paciente que já havia sido operado e a
biópsia não havia revelado células tumorais. O resultado do exame molecular
também foi negativo, reforçando a hipótese de que a cirurgia foi desnecessária.
“Começamos pelos extremos e agora vamos testar os pacientes em que haveria
dúvida. Se conseguirmos reunir evidências de que o método tem, de fato,
utilidade clínica, o próximo passo é testá-lo em uma amostra maior”, disse
Camargo. A grande dificuldade, segundo a
pesquisadora, é que nos casos de câncer retal não existe um padrão recorrente
de rearranjos cromossômicos. “Alguns pacientes podem ter dez rearranjos e
outros podem ter mais de cem. Com a tecnologia de sequenciamento disponível hoje
a um custo relativamente baixo, é possível analisar cada um dos tumores e
desenhar os ensaios moleculares de forma individualizada”, disse.
Paralelamente, os cientistas analisam o perfil de expressão gênica em outra
amostra de 30 pacientes para tentar identificar um conjunto de genes capaz de
indicar antecipadamente a resposta ao tratamento neoadjuvante. “Já achamos uma
assinatura gênica capaz de dividir os pacientes em dois grupos – aqueles que
respondem completamente ao tratamento e aqueles que têm resposta incompleta.
Mas, para ter certeza, precisamos fazer a validação em um grupo diferente de
voluntários”, explicou Camargo. Segundo
a pesquisadora, a estimativa é que no início de 2013 o sequenciamento de um
genoma humano completo poderá ser feito a um custo de US$ 1 mil. “Ainda é uma
metodologia cara e poderá levar um tempo até ser incorporada ao Sistema Único
de Saúde. Mas é um avanço importante e, como toda tecnologia nova, leva um
tempo para ser incorporada e socializada”, disse(Fonte: 2012 – Karina
Toledo, Salamanca, Agência Fapesp)
Exame simples de sangue.
Cientistas da Universidade de Bradford criaram um exame simples de
sangue que, em teoria, poderia ser usado para diagnosticar câncer. O teste vai
capacitar médicos a descartar o câncer para pacientes que apresentam uma série
de sintomas, tornando desnecessárias não apenas preocupações, mas a realização
de exames caros e invasivos como biópsias.
Os primeiros estudos com o exame mostraram que ele é capaz de
diagnosticar o câncer ou a eminência do desenvolvimento de câncer de cólon, de
pulmão ou melanoma. Batizado de Lymphocyte Genome Sensitivity (LGS), ele
analisa linfócitos e mede o dano causado em seu DNA, através de raios ultravioletas.
Os resultados mostram uma distinção clara entre pessoas saudáveis e quem tem ou
tem risco de desenvolver a doença. Os linfócitos são parte do sistema de defesa do
corpo e, quando o organismo está combatendo um câncer, as células ficam mais
frágeis. Se expostas a raios ultravioleta, elas sofrem danos no DNA de forma mais fácil
do que células saudáveis. E é dessa forma que ocorre o diagnóstico segundo as
diretrizes da pesquisa. Para verificar a hipótese, o estudo analisou amostras
de 208 pessoas - 94 voluntários eram saudáveis, enquanto 114 pessoas eram
pacientes em processo de diagnóstico ou tratamento. As amostras foram
coletadas, anonimizadas, e, então, foram submetidas ao exame. E o diagnóstico
foi feito de forma perfeita em todos os casos.
O exame deve passar por mais testes clínicos antes de sua administração
ser liberada.
QUESTÕES: Jurídicas e bioéticas.
A rapidez
das descobertas e da oferta
comercial de novos testes sem os
cuidados básicos necessários preocupa mesmo os que exploram
comercialmente os exames. A situação é extremamente preocupante, porque não há
nenhuma legislação para o setor, nem há a necessidade de se ter um médico
geneticista para abrir um laboratório genético aqui no Brasil. Atualmente, os
testes genéticos não são cobertos nem pelo Sistema Único de Saúde (SUS), nem
pela rede privada, e, para obter reembolso pelo teste, o paciente tem de entrar
com ação judicial. A resposta para a questão sobre quais exames genéticos
solicitar ou mesmo tornar disponíveis não é simples para médicos e
pesquisadores. Essa realidade de testes genéticos é uma coisa muito nova, e,
mesmo fora do Brasil, as pessoas estão tendo dificuldade para equacioná-la. O médico
Alexandre Costa Pereira, pesquisador do Laboratório de Genética e Cardiologia
Molecular do Instituto do Coração (InCor), em São Paulo, comenta que "Hoje
em dia se sabe de uma série de alterações genéticas que podem causar doenças,
temos até mesmo como descobrir essas alterações genéticas nas pessoas, mas, e
daí? O que fazer
com essa informação?"
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